Encontro de Monitoramento em territórios extrativistas evidência exclusão energética e aponta caminhos para o aperfeiçoamento do Luz para Todos

Encerrando o ciclo de ações de monitoramento de 2025, a Rede Energia & Comunidades participou, em novembro, do Encontro em territórios extrativistas marinhos, após iniciativas semelhantes realizadas em territórios indígenas, em março, e quilombolas, em agosto, com o objetivo comum de avaliar o acesso à energia elétrica e a efetividade das políticas públicas em territórios tradicionais.

Entre os dias 10 e 11 de novembro de 2025, na Reserva Extrativista (RESEX) Marinha de Canavieiras, no sul da Bahia, aconteceu uma visita técnica de monitoramento do acesso à energia elétrica em territórios extrativistas. Representantes do Ministério de Minas e Energia (MME), Agência Nacional de Energia Elétrica (ANEEL) e da RE&C – representada pelo WWF-Brasil e Instituto de Energia e Meio Ambiente (IEMA) – estiveram em comunidades da RESEX, acompanhados pelas lideranças comunitárias da Associação Mãe dos Extrativistas da RESEX de Canavieiras (AMEX) e do ICMBio.A atividade teve como objetivo avaliar, de forma participativa e técnica, as condições de acesso à energia elétrica, a qualidade do fornecimento e a implementação do Programa Luz para Todos nesses territórios já considerados universalizados com energia elétrica.Esse momento sintetiza, igualmente, demandas identificadas ao longo dos Encontros de Monitoramento Energético realizados em 2025, organizados pela Rede Energia & Comunidades. Destacam-se os encontros realizados no território indígena Wawi, no Xingu (MT), em comunidades quilombolas de Abaetetuba (PA), incluindo Bom Remédio e Piratuba, e em comunidades extrativistas na Reserva Extrativista (RESEX) Marinha de Canavieiras na Bahia. Nessas ocasiões, a formação comunitária em energia emergiu de forma recorrente como uma demanda estratégica, entendida pelas comunidades como condição necessária  para um acesso mais justo, digno e qualificado à energia elétrica. O fortalecimento das capacidades locais contribui para aprimorar a interlocução com as instituições responsáveis pela prestação do serviço público de energia, fortalecer a fiscalização social e assegurar a efetivação dos direitos das populações enquanto consumidoras reguladas.

Exclusão energética ainda é realidade em territórios extrativistas

As visitas de campo realizadas nas comunidades de Barra Velha, Peso e Campinhos confirmaram que a exclusão energética segue sendo um desafio estrutural na RESEX Marinha de Canavieiras. Em Barra Velha e Peso, dezenas de famílias permanecem sem acesso formal à rede de energia elétrica, dependendo de sistemas solares domésticos improvisados, de baixa capacidade e sem padrões adequados de segurança.

Mesmo na comunidade de Campinhos, que já conta com conexão à rede da concessionária, foram constatadas interrupções frequentes, quedas de tensão e longos períodos sem fornecimento, comprometendo atividades domésticas, produtivas e comunitárias. Em alguns casos, os cortes chegaram a durar vários dias consecutivos.

Além da precariedade do acesso, o encontro evidenciou riscos elétricos, como instalações internas sem aterramento, ausência de disjuntores e uso de baterias de chumbo-ácido deterioradas, frequentemente adquiridas com recursos próprios das famílias, sem garantia técnica.

Impactos sobre renda, saúde e organização comunitária

A falta de energia elétrica adequada afeta diretamente a base econômica das comunidades extrativistas. A impossibilidade de operar freezers e equipamentos de conservação compromete o armazenamento de pescados e outros produtos do extrativismo, gerando perdas econômicas e reduzindo a autonomia produtiva das famílias.
Outro ponto crítico observado foi a ausência de políticas de cocção limpa. O uso predominante de lenha para o preparo de alimentos e para o beneficiamento da produção mantém as famílias, especialmente as mulheres, expostas à poluição intradomiciliar e fora do alcance de programas como o Gás do Povo, evidenciando a necessidade de integração entre políticas de energia, saúde e assistência social.
Também foram identificadas dificuldades no funcionamento de associações comunitárias, escolas e sistemas de abastecimento de água, que permanecem sem energia ou com fornecimento instável, limitando reuniões, cursos de formação e o acesso regular à água.

Avanços: tarifa social e inovação digital no monitoramento

Apesar dos desafios, o encontro de monitoramento também identificou avanços. Na comunidade de Campinhos, foi verificada a aplicação efetiva da Tarifa Social de Energia Elétrica, por meio do programa Luz do Povo, garantindo isenção total da fatura para famílias com consumo de até 80 kWh/mês, incluindo tributos estaduais e taxas de iluminação pública municipal. A política representa um avanço concreto em justiça tarifária e redução da vulnerabilidade energética. 

Outro destaque foi o teste operacional do aplicativo Luz para Todos, iniciativa do MME e do Ministério da Gestão e da Inovação em Serviços Públicos (MGI), realizado em áreas sem conectividade à internet. A ferramenta possibilita o cadastramento de famílias ainda não atendidas pelo programa, com registro fotográfico e georreferenciamento automático das residências, ampliando a capacidade de identificação, o cruzamento com o cadastro único (CadÚnico), a integração com outras políticas públicas e o acompanhamento das demandas nos territórios. O teste demonstrou funcionamento adequado em contextos de difícil acesso, com transmissão posterior bem-sucedida dos dados coletados, e o lançamento da ferramenta está previsto para o início de 2026.

Energia como direito e condição para a justiça socioambiental

Essa ação na  RESEX Marinha de Canavieiras reforçou que o acesso à energia elétrica segura, contínua e adequada é um direito fundamental e um elemento central para a permanência digna das populações tradicionais em seus territórios.

Para a Rede Energia & Comunidades, experiências como essa evidenciam a importância do monitoramento participativo, da escuta qualificada das comunidades e do fortalecimento das políticas públicas para que a universalização do acesso à energia não reproduza desigualdades, mas promova justiça social, ambiental e territorial.

Leia a Contribuição da Rede Energia & Comunidades na íntegra!

A partir das visitas de campo e dos diálogos realizados durante a visita técnica na RESEX Marinha de Canavieiras, a Rede Energia & Comunidades sistematizou uma Contribuição que apresenta um balanço do cenário de acesso à energia nos territórios extrativistas, reunindo diagnósticos, evidências de campo e encaminhamentos gerais para o aprimoramento das políticas públicas, em especial do Programa Luz para Todos.

Acesse a Contribuição da Rede Energia & Comunidades na íntegra e confira a análise completa do cenário e os caminhos apontados.

 

Autores:
Julia Soares
Vinicius
Alessandra

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